A melatonina é uma molécula antiga e onipresente na natureza, apresentando múltiplos mecanismos de ação e funções em praticamente todo organismo vivo.
Também conhecida como N-acetil-5-metoxitriptamina, a melatonina, é um neuro-hormônio produzido pela glândula pineal – estrutura que se encontra dentro do nosso cérebro – durante o período noturno!
A glândula pineal, produz melatonina a partir de serotonina e é fundamentalmente dependente da
luminosidade do ambiente. A melatonina também é produzida, em menores quantidades, na retina e no trato gastrointestinal.
Apesar de ainda não sabermos ao certo os mecanismos exatos de ação, as funções da melatonina já são bastante
conhecidas.
Qual a função da melatonina?
Em mamíferos a melatonina funciona como um hormônio e um cronobiótico, desempenhando importante papel na regulação da ordem temporal circadiana interna (o famoso “relógio biológico”).
A melatonina, conhecida como “o hormônio do sono”, regula os ciclos circadianos (dormir-acordar), sendo a sua produção estimulada pela escuridão e inibida pela luz.
Diversos estudos já relacionaram distúrbios do sono a problemas de saúde, incluindo maiores riscos de depressão, obesidade, diabetes e câncer. Porém, são poucos aqueles que conseguiram explicar de que forma isso acontece — a maioria apenas identificou uma maior prevalência dessas condições em pessoas que dormem mal.
A redução da produção de melatonina pode ser atribuída a vários fatores, como a carência nutricional, a associação de substâncias químicas e remédios, o estresse e o processo de envelhecimento. Sob estresse, o indivíduo passa a produzir mais cortisol e adrenalina, que por sua vez também levam à produção de radicais livres, tornando as células mais propensas à ocorrência de uma lesão.
Sabe aquela “olhadinha” rápida no celular antes de dormir?
Ela pode prejudicar muito a produção de melatonina, isso porque células presentes nos nossos olhos e sensíveis a claridade enviam sinais para a pineal que “barram” a produção da substância.
Assim sendo, a exposição mesmo que curta à luminosidade (luz brilhante) ao deitar-se ou perto da hora de dormir é suficiente para suprimir a produção da melatonina.
Portanto, lembre-se que a escuridão é o requisito absoluto para a sua produção e liberação, e a luz rapidamente a suprime. Esta é a razão da concentração de melatonina no sangue e nas células ser 3 a 10 vezes maior à noite.
Por outro lado, quando o indivíduo acorda e recebe a luz intensa do sol da manhã a melatonina se transforma em serotonina, o hormônio do bom humor.
Os distúrbios do sono e a ação terapêutica da melatonina
A melatonina funciona como indutor do sono. Nesse sentido, muitos fatores podem influenciar na qualidade dele e, portanto, associam-se à melatonina direta ou indiretamente.
Atraso da fase do sono
Diversas situações clínicas se associam a atrasos, avanços ou perturbações do ritmo fisiológico do sono e, nesses casos, a melatonina apresenta boa ação terapêutica.
O atraso da fase do sono é uma condição que se expressa mais na adolescência como uma tendência para dormir tarde e acordar tarde. Em alguns casos os pais confundem esses sintomas com insônia ou com sonolência diurna.
A exposição ao sol pela manhã e o uso da melatonina algumas horas (3-5) antes da hora desejada do sono pode reestabelecer os horários regulares de sono. É comum que esta condição seja de manifestação familiar e transtorno do humor pode coexistir principalmente nos casos graves.
Inclusive, alguns pesquisadores e médicos acreditam que o atraso de fase do sono e o transtorno depressivo estejam intimamente correlacionados.
Avanço da fase do sono
O avanço de fase é o contrário do exposto acima e é freqüentemente observado em idosos. Esses indivíduos deitam-se muito cedo e despertam nas primeiras horas da madrugada. A exposição a luz no final da tarde costuma prolongar o início do sono para horários mais desejados.
Jet Lag
Pessoas que viajam para outros países com fuso horário diferente do que se está acostumado sentem o Jet Lag!
Esse “fenômeno” é causado pelas alterações hormonais e de temperatura corporal que não acompanham a vigília e o sono.
O Jet Lag torna-se pior com a idade mais avançada, quando os mecanismos de adaptação se reduzem.
Além disso, sintomas como fadiga, dores no corpo, cefaléia, irritabilidade e alterações cognitivas podem ocorrer apesar do indivíduo sentir-se desperto. O ajuste de temperatura corporal pode levar alguns dias.
A fim de minimizar os sintomas, a exposição a luz pode ser utilizada. O uso da melatonina uma hora antes de deitar-se facilita a adaptação no jet lag.
Auxilia no tratamento da enxaqueca
Uma pesquisa brasileira mostrou que a melatonina é eficaz na prevenção de enxaqueca em pessoas que têm crises com frequência. Segundo o estudo, coordenado por Mario Peres, neurologista do Hospital Albert Einstein e da Escola Paulista de Medicina, pílulas contendo a substância parecem ser melhores para evitar as fortes dores de cabeça do que um dos medicamentos mais utilizados atualmente com essa finalidade (amitriptilina).
Além disso, em pacientes com enxaqueca foram detectados níveis diminuídos de melatonina e alteração na sua curva de secreção. Indivíduos acometidos de enxaqueca dormem menos, têm latência de sono maior, e mais despertares noturnos.
O envelhecimento e a função cognitiva
Durante o envelhecimento a produção de melatonina sofre um declínio gradual. Nas pessoas com idade superior a 75 anos, o seu ritmo de produção nas 24 horas é somente uma pequena fração daquele observado nas pessoas de 20 a 30 anos, o que faz atribuir à melatonina um possível papel nas fases iniciais e no desenvolvimento das doenças degenerativas da idade.
Influência sobre o metabolismo
Diversos estudos mostram que animais ou indivíduos que apresentam ausência ou redução da produção de melatonina desenvolvem resistência insulínica, intolerância à glicose, distúrbios na secreção de insulina, dislipidemia (alterações no colesterol e suas frações), distúrbios do balanço energético e obesidade.
Além disso, a habitual distribuição diária do metabolismo associada ao ciclo vigília-sono e ao ciclo de ingestão alimentar-jejum desaparece completamente. Ou seja, o ciclo metabólico diário caracterizado por fases de jejum e alimentação desaparece completamente, caracterizando o que os especialistas chamam de cronorruptura.
Dessa forma, a ausência ou redução na produção de melatonina provoca distúrbios metabólicos e
distúrbios rítmicos circadianos que acabam intensificando uns aos outros, culminando no desenvolvimento da obesidade.
Relação com a obesidade
Além dessa maneira que a melatonina tem de regular o peso corpóreo, há outra, mais direta, que se
dá através do seu papel na regulação do balanço energético. Assim, toda a energia ingerida através da
alimentação é utilizada ou armazenada nos estoques energéticos para uso futuro.
Há evidências experimentais sólidas mostrando que a melatonina age regulando cada uma das etapas do balanço
energético: a ingestão alimentar, o fluxo de energia para e dos estoques, e o dispêndio energético.
A melatonina é um hormônio que regula principalmente por ação central (ou seja, que age no sistema nervoso central):
- a ingestão alimentar reduzindo-a, ainda que ligeiramente;
- a produção e secreção de insulina, glucagon e cortisol, organizando, assim, o fluxo das reservas energéticas para e dos estoques;
- e aumenta o gasto energético, ativando o tecido adiposo marrom e participando do processo de transformação do tecido adiposo branco em marrom.
Portanto, pode ser considerada como mais um fator hormonal no combate e prevenção à obesidade.
Suplementação e efeitos colaterais
A suplementação exógena de melatonina vem surgindo como uma promissora alternativa utilizada, principalmente, para os distúrbios do sono não demonstrando toxicidade ou efeitos colaterais, nem dependência, mesmo em doses elevadas quando comparada com os efeitos adversos de outros fármacos prescritos para insônia, e demais distúrbios associados à ausência e/ou redução na produção de melatonina.
Vale ressaltar que não se conhecem os efeitos de longo prazo da melatonina e que algumas reações como fadiga, cefaléia, tontura e irritabilidade já foram descritas.
Finalmente, com relação às dosagens e melhor maneira de consumir a melatonina sintética, os estudos variam entre 0,1 e 10mg, de acordo com cada condição a ser tratada. Para melhorar o sono, a recomendação é de iniciar o tratamento com a dosagem de 1 mg e progressivamente aumentar até 6mg.
Referências:
-
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- de Bruin, V. M. S. IMPORTÂNCIA DA MELATONINA NA REGULAÇÃO DO SONO E DO RITMO CIRCADIANO- UMA ABORDAGEM CLÍNICA. Disponível em: http://www.sbpcnet.org.br/livro/57ra/programas/CONF_SIMP/textos/veralicebruin.htm;
- Vieira, R. B., Dantas, A. de A., Cayana, E. G. Suplementação da melatonina como alternativa para insônia. II CONBRACIS. 201….Disponível em: http://www.editorarealize.com.br/revistas/conbracis/trabalhos/TRABALHO_EV071_MD4_SA1_ID808_15052017203305.pdf;
- Botas, F. M. C. O papel da melatonina. Dissertação de Mestrado. Setubal: ISCSEM, 2014.