Como funciona a dieta por nutrição enteral

A definição tradicionalmente utilizada de nutrição enteral é “a administração de nutrientes pelo trato gastrointestinal (TGI) através do artifício de sondas”.

Trato gastrointestinal também é conhecido como “tubo digestivo”. O trato gastrointestinal superior é formado por: boca, faringe, esôfago e estômago. Já o trato gastrointestinal inferior, por: intestino delgado e intestino grosso.

Atualmente, o uso de dietas “originalmente desenhadas” para uso enteral, mesmo que ingeridas via oral, são consideradas alimentação enteral.

Nutrição ou alimentação enteral faz parte da terapia nutricional que constitui parte integral do cuidado ao paciente.

Um dos principais objetivos desse tipo de abordagem nutricional é prevenir a desnutrição, frequente em pacientes hospitalizados, isso porque o estado nutricional prejudicado aumenta o risco de complicações e piora a evolução clínica dos pacientes.

A maneira como os alimentos, ou nutrientes entram no organismo é “categorizada” em três diferentes formas:

Via oral: esta via é utilizada por todos os indivíduos saudáveis, que possuem todas as funções do trato gastrointestinal adequadas, tanto digestivas quanto absortivas e que, portanto, não apresentam nenhum impedimento de utilização da totalidade do trato gastrointestinal;

Via Enteral: essa modalidade de terapia nutricional é utilizada quando alguma parte do TGI não pode ser utilizada, ou seja, pode ser usado parcialmente. Normalmente por motivos de doenças como alguns tipos de câncer, trauma, pancreatite, condições onde o TGI não é capaz de absorver adequadamente os nutrientes, etc. O que se faz nesse caso é introduzir uma sonda até o ponto em que o TGI possa ser utilizado normalmente;

Via Parenteral: a terapia parenteral é a entrada de nutrientes via venosa, ou seja, o TGI em sua totalidade não pode ser utilizado. Dessa forma os nutrientes são ofertados diretamente na corrente sanguínea em soluções minuciosamente calculadas e individualizadas de acordo com a necessidade específica do paciente.

Quando a nutrição enteral é utilizada?

A “regra” é : se o TGI funciona, mesmo que parcialmente, use-o!

Há indicação de alimentação via enteral a qualquer indivíduo sem condições de atender ao menos 60% de suas necessidades nutricionais, voluntariamente, por meio da via oral, desde que o TGI seja funcionante e tenha capacidade de digerir e absorver alimentos, mesmo que parcialmente.

A alimentação via enteral é tida como a mais fisiológica (ou natural), quando comparada com a parenteral, por evitar atrofia da mucosa intestinal, manter a flora intestinal mais próxima do normal e preservar a função imune do TGI.

A terapia nutricional enteral poderá ser indicada tanto como via exclusiva para administração de calorias e nutrientes como na forma de suplementação, associada à via oral e/ou parenteral.

Nesse sentido, quanto mais cedo se instalar uma terapia nutricional bem conduzida, melhor será o impacto da abordagem sobre o estado nutricional do paciente.

Como funciona a terapia nutricional enteral?

A administração da dieta enteral pode ser feita de duas maneiras:

  1. Mediante colocação de uma sonda pela região nasal, com posicionamento gástrico;
  2. Através de uma ostomia (abre-se um pequeno orifício), onde é fixada a sonda, geralmente em posição gástrica (gastrostomia) ou jejunal (no intestino, jejunostomia).

Assim sendo, a sonda, em si, nada mais é do que um “tubo” normalmente de material plástico ou silicone, hipoalergênico e flexível.

A espessura da mesma também varia de acordo com o tipo de fórmula a ser administrada e posicionamento.

A colocação da sonda é, em geral, fácil e descomplicada. A posição correta desta sonda é verificada através de raio-x.

Técnica de administração de dietas

As técnicas de administração de dieta enteral dividem-se em dois grandes grupos:

  • Intermitente: a dieta é administrada em períodos fracionados. Ou seja, é como a via oral, comemos várias vezes ao dia. Nessa modalidade temos uma dinâmica bem semelhante;
  • Contínua: nessa modalidade a dieta é administrada de forma contínua por 12 ou 24 horas, através de uma bomba de infusão.

Em ambas as modalidades a quantidade de dieta fornecida é totalmente controlada.

Necessidades nutricionais, volume de dieta e formulação enteral

Para calcular a necessidade calórica e nutricional do paciente, o nutricionista utiliza fórmulas que levam em consideração fatores como o peso, a altura, idade e os fatores de estresse (como o tipo de doença) ou lesão (se o paciente sofreu queimaduras ou trauma, por exemplo).

O volume da dieta dependerá muito da escolha dos alimentos que entrarão na composição da dieta bem como se a fórmula escolhida será in natura (caseira, artesanal ou blend) ou industrializada, isso porque a densidade calórica de cada tipo é diferente.

Densidade calórica nada mais é do que a quantidade de calorias que cada mililitro de dieta vai fornecer para o paciente.

Por exemplo, se o paciente precisa de 2000 kcal/dia e a fórmula enteral fornecer 1 kcal/ml o volume final de dieta a ser ofertada será de 2000 ml.

Entretanto, mais uma vez vale ressaltar que, assim como as necessidades calóricas e nutricionais são específicas para cada situação, o mesmo vale para a determinação do volume da dieta!

Já a escolha dos alimentos/nutrientes, que comporão a fórmula enteral, dependerá:

  • das necessidades nutricionais do paciente;
  • da capacidade funcional do TGI;
  • do posicionamento e da espessura da sonda;
  • da duração da terapia enteral;
  • da doença com a qual o paciente está lidando e a situação de saúde geral do mesmo.

Nesse sentido, os nutrientes, em geral, podem ser veiculados das seguintes formas:

Fórmulas in natura ou caseiras (artesanais ou blender)

São aquelas preparadas a base de alimentos in natura ou mesclas de produtos naturais com industrializados, liquidificados e preparados artesanalmente em cozinha doméstica ou hospitalar.

Vantagens: individualização da fórmula quanto à composição nutricional e volume. Custo aparentemente menor que o da dieta industrializada.

Desvantagens: pode haver problemas de contaminação caso a higiene em alguma etapa seja negligenciada e alguns estudos mostraram que o fornecimento adequado de micronutrientes se mostra prejudicado.

Fórmulas industrializadas

Por outro lado, as fórmulas industrializadas, são divididas em 3 tipos:

  • Em pó para reconstituição:

Em geral, acondicionadas em pacotes hermeticamente fechados, em porções individuais ou em latas. Necessitam de reconstituição em água ou outro líquido.

Vantagens: fornecimento adequado de micronutrientes, armazenamento facilitado e menor chance de contaminação uma vez que é bem menos manipulado do que a caseira, por exemplo.

Desvantagens: embora seja menos manipulada, esta etapa de preparo pode constituir um viés uma vez que é passível de manipulação inadequada e consequente contaminação.

  • Líquida “semipronta” para uso:

São dietas já industrialmente reconstituídas. Apresentam-se em latas ou frascos, em quantidades suficientes para um horário da dieta.

O volume das latas varia entre 230 e 260 ml.

Vantagens: exigem o mínimo de manipulação, são mais estáveis nutricionalmente falando, ou seja, são eficientes na “oferta” adequada de micronutrientes.

Desvantagens: não favorece a individualização da fórmula, uma vez que já vem pronta para uso; além disso, por ser relativamente grande, a embalagem acaba sendo mais difícil de transportar e armazenar.

  • Pronta para uso:

Por sua vez, as fórmulas prontas para uso são aquelas que já se apresentam envasadas, acondicionadas em frascos e/ou bolsas próprias, que são diretamente ofertadas ao paciente.

O volume dos frascos, geralmente, varia entre 1000 e 1500 ml.

Vantagens: nenhuma manipulação, oferta adequada de micronutrientes, pode ser utilizada em domicílio ou em ambiente hospitalar.

Desvantagens: não há possibilidade de alteração na formulação para individualização da mesma, são mais caras quando comparadas com as caseiras, por exemplo, e como são embalagens de 1000 a 15000 ml podem gerar dificuldades no quesito transporte e armazenamento.

Considerações finais

Finalmente, ao longo deste post podemos observar como a nutrição enteral é complexa e essencial no combate à desnutrição em pacientes em condições de saúde consideradas graves.

Nesse sentido, a adequação da terapia nutricional enteral (TNE) se inicia no momento de decidir sua indicação, seguida pela prescrição com base na determinação das necessidades nutricionais, doença e nos procedimentos terapêuticos associados.

Portanto, o sucesso da TNE depende da rigorosidade de monitoramento realizado pela equipe multidisciplinar (nutricionista, médico e enfermeiro) que deve ser especializada, para minimizar o risco de complicações associadas.

Referências:

  1. da Silva, S. M. C. S., Mura, J. D’arc P. Tratado de alimentação, nutrição e dietoterapia. 1° ed. Ed. Roca – São Paulo, 2007.
  2. Sawaya, A. L., Leandro, C. V. G., Waitzberg, D. Fisiologia da nutrição na saúde e na doença: da biologia molecular ao tratamento. 1°ed. Ed. Atheneu – São Paulo, 2013;
  3. Baxter, Y. C., Waitzberg, D. ; Gama Rodrigues, J. J., Pinotti, H. W. Parâmetros de decisão na seleção de dietas enterais. In: Waitzberg, D. Nutrição oral, enteral e parenteral na prática clínica. 3° ed. Ed. Atheneu – São Paulo, 2000;
  4. Bordejé L. L., Lorencio C.C., Acosta E. J. Guidelines for specialized nutritional and metabolic support in the critically ill-patient. Update. Consensus of the Spanish Society of Intensive Care Medicine and Coronary Units-Spanish Society of Parenteral and Enteral Nutrition (SEMICYUC-SENPE): severe acute pancreatitis. Med Intensiva. v;35 Suppl 1:33-7., 2011. Disponível em: http://www.medintensiva.org/es/linkresolver/recomendaciones-el-soporte-nutricional-metabolico/S0210569111700018/

Add a Comment

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *